terça-feira, 31 de março de 2009

Carta ao Pai Natal



Querido pai natal, espero encontrar-te bem, com saúde e feliz.

Por aqui está tudo bem, temos saudades tuas. Bem sei que é um pouco cedo para te escrever mas as coisas aqui em casa não estão famosas.
Está um frio de rachar, não temos ligado o aquecimento porque o gás e a luz estão pela hora da morte, houve um surto de gripe que até foi, quase quase uma epidemia, até os ordenados estão prestes a congelar. Espero que andes bem agasalhado. Pode ser que com a chegada da primavera a coisa comece a aquecer. Pelo menos os incendios estão quase á porta.
Se reparares em algum erro ortográfico não ligues, estou a escrever-te do magalhães, uma coisa que o Sócrates inventou para nos ajudar a melhorar a educação dos miúdos.
Tenho boas notícias, são tantas que nem sei bem por onde começar. Os índices de violência doméstica estão a baixar. A ministra da educação achou melhor serem os alunos a acertar o passo às professoras. Assim o problema fica resolvido durante o dia, os maridos têm mais tempo livre e ainda se poupa nos serviços de atendimento á vitima durante a noite. Quando os miúdos não têm tempo são os pais que tratam do assunto.
Já sabes do freeport? É natural que não, deves andar ocupado a montar painéis solares. Eu ainda não mandei vir os meus, isto anda um bocado apertado de finanças. Agora tenho muito tempo livre, pagam-me um subsídio para estar em casa, acho que se chama de desemprego, é bom porque assim tenho mais tempo para reciclar coisas e não contribuo para o buraco na camada do ozono. Como nem todos recebem esse subsídio a criminalidade aumentou, mas o que é importante são os painéis solares. Como vês está tudo controlado.
Dizem que daqui a uns anos não haverá dinheiro para pagar as reformas, mas, tivemos a Expo, temos um monte de estádios novos e vamos receber de presente um TGV. Quanto às reformas penso não haver problemas, na verdade a população está a envelhecer a uma rapidez extraordinária mas, uma vez que não á dinheiro para medicamentos e idas ao hospital , vamos ter uma grande redução no número de idosos Quanto á restante população, não há emprego portanto também não se tem direito as ditas pensões. No problem, só espero que o Vaticano não multe o Bispo LLídio Leandro pelas declarações sobre o preservativo , bem , pelo menos acabou finalmente a pouca vergonha no BCP, foi o que disse o Joe Berardo . E as coisas vão andando assim, com estes importantes acontecimentos.
Agora andamos todos virados para o problema da Quimonda, estamos a criar laços de amizade com o banco alimentar e a preparar manifestações, vemos novelas e vamos ao futebol que para isso ainda vão sobrando uns trocos.
Queria fazer-te uma lista com alguns pedidos para o natal deste ano mas ao ler esta carta, apercebo-me que afinal as coisas não estão assim tão mal.
Peço só que ofereças ao nosso governo uma caixinha de bom bons entregue por um palestiniano socialista. Isso sim seria uma bomba de felicidade para este natal.

Obrigada e até Dezembro
( a minha vida é uma cruz )

Quem eu encontro de vez em quando


Mal deitei o pé ao mundo, herdei imediatamente todas aquelas coisas da história filogenética, nome que inventaram para o banal, para a estupidez deixada pelos antepassados. É mesmo assim essa coisa da história filogenética, mesmo que não se queira tem que se levar .
Obrigadinha!

Amparada pelos braços da minha mãe, responsável por me alimentar e enfim, assegurar a satisfação de todas as minhas necessidades básicas, lá fui eu para casa. Conheci a família, amigos e vizinhos, conheci muita gente, aprendi imensas coisas.
Já criança espigadota, fui para a escola, conheci a professora, os coleguinhas e aprendi imensas coisas, mudei de casa, mudou a família, ganhei mais vizinhos, continuei a aprender coisas, a crescer, a conhecer gente. O corpo foi mudando, as paisagens foram mudando, tudo isto e mais umas borbulhas na cara, umas idas ao hospital, um porquinho mealheiro, uns lacinhos, as calças rasgadas e á procura, sempre á procura.
Lá vou eu e mais as borbulhas para onde se aprende a ser doutor, um sítio onde explicam umas merdas a uma montanha de palermas como eu, eu sentada numa fileira de mesas com uma pilha de papelinhos para ler, a miupia a aumentar e a acompanhar o conhecimento científico do comportamento humano (ainda estou baralhada em relação a isto, comportamento ou expressão?).
Umas bebedeiras, uns quantos neurónios a menos, fases do sono a repor e já sem borbulhas mas ainda de calças rasgadas, sigo em busca de uma coisa que precisamos para continuar a crescer, O ORDENADO, escudos que entretanto também mudaram para euros. Foi-se o porquinho, ganhei uma conta bancária e uma serie de problemas, conheci o contabilista, a fila das finanças e a fila da segurança social, mais tarde e depois de uns electrochoques fiquei-me pelo contabilista e vá lá, com o ordenado.
A esta altura descobri que andava a procura de independência, de liberdade, que tinha de aprender a responsabilidade, que para ser livre tinha de ser responsável, blá, blá, blá…
Os montes de papéis, os vizinhos, as borbulhas, o contabilista, estou-me cagando para tudo, que triste sorte, isto de passado filogenético, sim porque supostamente recebemos dos nossos antepassados características que determinam certos comportamentos, traços de personalidade, basicamente nascemos com uma “ formataçãozinha” do sistema que eventualmente explica o estereótipo a que se resume a nossa vida.
Continuo a crescer, continuo na escola, cega, perdida na imensidão de coisas que não posso ver mas, posso sonhar… encontro os meus vizinhos, os professores, o contabilista, encontro-os todos os dias, a mim, encontro-me de vez em quando.